Safra recorde gera busca por tecnologia

Novas máquinas ajudam o produtor a atender demanda internacional e aumentam a projeção de colheitas futuras

Infraestrutura de transportes e câmbio desfavorável limitam lucros e impedem aumento da produção

Aumento de área plantada, índices inéditos de produtividade e alta demanda no mercado internacional devem fazer da safra 2010/ 2011 a maior da história, segundo a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).

Os bons resultados vão impulsionar investimentos dos fazendeiros em novas técnicas e tecnologias de produção e colheita nas propriedades, mas não alteram a realidade da porteira para fora: poucas ferrovias e hidrovias, rodovias em péssimo estado e portos sobrecarregados.

"Continuamos com problema em estradas e portos e não temos mais como aumentar a produção", diz o presidente da Aprosoja Brasil (Associação dos Produtores de Soja), Gláuber Silveira.

A última estimativa da Conab, deste mês, aponta que a produção de grãos deve atingir 157,4 milhões de toneladas, um aumento de 5,5% ante a safra 2009/2010.

A área plantada com as principais culturas cresceu 1,84 milhão de hectares (quase o território do Sergipe). Essa situação, aliada à recuperação dos preços no mercado internacional, aponta um cenário propício para investimentos e ganho de produtividade para a safra 2011/2012.

"Quando o produtor ganhava uns trocos, comprava terras novas em regiões novas. Com tantas restrições ambientais, isso não é mais possível. Esse dinheiro a mais será investido em tecnologia dentro da fazenda", diz o produtor Sérgio Stefanello, de Mato Grosso.

Entre os desejos, estão máquinas de plantar e colher com piloto automático, guiadas por GPS e capazes de gerar relatórios em tempo real da produção, que podem custar até R$ 1,1 milhão.

"Em 2009, vendemos três sistemas de piloto automático. No primeiro trimestre de 2011, foram 14", diz Carlos Mello, 29, coordenador em uma revenda de Campo Novo do Parecis (MT).

A melhora nos investimentos é nítida em outros indicadores. Segundo o Imea (Instituto Matogrossense de Economia Agrícola), os produtores de MT já haviam comprado 76% dos insumos (sementes, fertilizantes e defensivos) previstos para a próxima safra de soja, que será plantada a partir de setembro.

Um dos fatores negativos para os produtores foi o câmbio, que afetou os ganhos dos que venderam a soja antecipadamente em dólar, caso de 75% da safra do Estado.

TRANSPORTE

Em termos de logística, Mato Grosso sofre com a falta de alternativas. A BR-163 (Cuiabá-Santarém), não duplicada, é o principal canal de escoamento para 41 cidades que concentram quase 50% da produção e é operada além da capacidade.

Segundo a Aprosoja, 47% da produção de soja e 74% da produção de milho de MT são escoadas por meio dos portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR), sendo o modal rodoviário o mais empregado.

O escoamento por Santarém (PA), alternativa considerada fundamental para a região, depende do término do asfaltamento e duplicação da BR-163.

"Em Mato Grosso, poderíamos estar produzindo 5 milhões de toneladas a mais. Mas não temos por onde tirar", diz Gláuber Silveira.

Máquinas reduzem desperdício e ajudam a planejar produção

Cada caminhão que sai carregado de soja da fazenda Santa Amélia, em Campo Novo do Parecis (MT), fecha um ciclo que, graças aos avanços tecnológicos, começou muito antes do plantio da safra, no ano anterior.

Cada um dos 3.600 hectares destinados ao plantio é georreferenciado, analisado segundo suas características (pH, proporção de nutrientes e a presença de pragas) e manejado com o auxílio de máquinas de pulverização, adubação e colheita equipadas com piloto automático e GPS.

"Reduzimos o desperdício: cada trecho recebe só o adubo e o fertilizante necessários, nada a mais, nada a menos", diz Roberto Chioquetta, 50, um gaúcho que chegou à região há 21 anos.

Chioquetta planta soja na safra principal. Na safrinha, usa 1.600 hectares para o plantio de milho comum, milho para pipoca e girassol.

O plantio é precedido por um mapeamento detalhado do potencial e das deficiências da propriedade. O diagnóstico usa imagens de satélite e o resultado da análise de amostras do solo.

O mapeamento vai para um cartão de memória e determina o trabalho das máquinas que irão preparar o solo. "Basta plugar no trator", diz Chioquetta.

Uma plantadeira que, junto com o trator que a conduz, forma um conjunto de R$ 1 milhão é comandada com o auxílio de um joystick e funciona com um sistema de GPS. Toda a programação é feita pelo operador do trator, que trabalha em cabine refrigerada. A maior parte dos comandos é feita em uma tela sensível ao toque.

A colheitadeira também obedece a uma programação e tem sensores que avaliam a produção em cada trecho colhido, em tempo real os dados geram um mapa de produtividade que é base de trabalho para a safra seguinte.

Depois de colhida, a produção é armazenada em sete silos que estão ligados a um sistema eletrônico que monitora e faz o controle automático de peso, temperatura e umidade dos grãos.

Na etapa da venda, os caminhões são carregados sobre uma balança eletrônica, ligada ao escritório da propriedade. "Emitimos a nota fiscal na hora."

Chioquetta diz que a modernização cortou pela metade o número de funcionários, mas dobrou a folha de pagamentos. "É difícil encontrar pessoal especializado", afirma.


Por Rodrivo Vargas, FSP, 24 de abril de 2011, p.B4.


Países produtores não respondem à altura da demanda

Mais que celebrar safra, Brasil deveria se questionar sobre o que impediu resposta adequada a oportunidades do mercado

A previsão de que o La Niña causaria impactos negativos na produtividade da safra brasileira 2010/11 não se confirmou e volumes recordes são previstos pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).

Segundo a Conab, a área cultivada foi de 49,3 milhões de hectares e a produção total deve chegar a 157,4 milhões de toneladas, valores, respectivamente, 3,9% e 5,5% superiores à safra 2009/10, que também foi boa. E, por conta dos preços externos, o produtor brasileiro também terá rentabilidade favorável, embora parte seja absorvida pela alta do real.

Se olharmos mais adiante, pensando já na safra 2011/12, o cenário atual aponta para uma continuidade da situação positiva para a agricultura. Sustentados pela demanda por alimentos e pela baixa capacidade de resposta da produção mundial, os preços das commodities agrícolas devem se manter elevados.

Entre os fatores estruturais da demanda estão o crescimento populacional combinado com o aumento da renda e a crescente taxa de urbanização, em especial na China, que, além do aumento no consumo, promove a mudança no padrão alimentar.

O aumento de renda permite que a carne faça parte da alimentação desse "novo" consumidor, que agora consome soja, milho e trigo na forma de proteína animal.
Soma-se a isso a demanda mundial de grãos destinados aos biocombustíveis.

Não estamos querendo dizer que os preços seguirão essa trajetória de alta indefinidamente. Mas apenas chamar a atenção para o fato de que, nos últimos cinco anos, os preços dos alimentos reverteram sua tendência de queda de longo prazo e estão em curva ascendente.

Na realidade é uma quebra de paradigmas na economia agrícola, no qual os preços dos alimentos, que estavam ditados mais pela oferta, agora se encontram pautados mais pela demanda.

Os países produtores não conseguem responder à demanda por alimentos. Nos últimos cinco anos, a área de grãos no Brasil descontada as áreas de duplo cultivo anual- cresceu somente 1,9 milhão de hectares.

Diante desse cenário, questionamo-nos se os números da safra recorde devem ser comemorados ou se deveríamos nos questionar sobre quais os fatores que impediram uma resposta adequada da agricultura brasileira ante as oportunidades oferecidas pelo mercado.

Por Alexandre Mendonça de Barros, Ana Laura Menegatti e José Carlos Hausknecht, FSP, 24 de abril de 2011, p. B5.

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