Governo planeja privatizar novos portos
O governo prepara um novo modelo para o setor portuário nacional de modo a garantir investimentos e dar conta dos atuais gargalos de infraestrutura.
São dois os objetivos em estudo: ampliar a influência da União sobre portos públicos repassados à administração de Estados e municípios e entregar à iniciativa privada a construção e a operação de futuras instalações.
Ainda não há definição sobre o total de complexos que passarão às mãos privadas.
O Plano Geral de Outorgas, da Agência Nacional de Transportes Aquaviários, fala em 45. Mas, segundo a Folha apurou, o total de portos repassados à iniciativa privada deve chegar somente à metade dessa meta.
A decisão caberá à Secretaria de Portos. A presidente Dilma Rousseff receberá a versão final da proposta no segundo semestre.
No caso das concessões, a lógica é garantir recursos a uma atividade econômica que necessita de aportes superiores a R$ 40 bilhões, conforme dados do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
PRIMEIROS CANDIDATOS
Já há uma lista de quatro empreendimentos em condições de entrar no regime de outorga: porto de águas profundas, em Vitória; Porto Sul, da Bahia; novo porto de Manaus e o terminal de Vila do Conde (PA).
Os dois últimos são os que estão mais adiantados.
A única concessão já tornada oficial é a do porto novo de Manaus. O edital deve sair ainda neste ano. "Vamos analisar as concessões caso a caso. Ainda não dá para determinar quais", disse à Folha o ministro Leônidas Cristino.
O governo quer, ainda, instituir o que chama de "delegações compartilhadas".
Na prática, esse modelo dá mais poder à União sobre os portos públicos geridos pelos demais entes da Federação.
O governo também busca formas de fazer com que Estados e municípios arquem com os recursos financeiros necessários a obras de infraestrutura e novos projetos.
Hoje, a União é a maior patrocinadora dos portos, mas não "arbitra o jogo".
O governo é dono de 34 portos marítimos, mas controla diretamente apenas 18. Os demais têm a gestão delegada a Estados e municípios.
PARANAGUÁ
Para a secretaria, portos delegados como o de Paranaguá são estratégicos para o país, não só para o Estado.
Os terminais de lá escoam praticamente toda a soja produzida no Sudeste e no Centro-Oeste. "Vamos participar mais na gestão e no planejamento dos portos delegados, que são da União. Queremos que todos nos ajudem a investir", disse o ministro.
O ministério também quer rever os critérios de autorização dos terminais privados, hoje sob regras mais flexíveis que no regime de concessão.
Empresas podem construir e operar estruturas próprias nos portos.
O problema, diz o ministério, é que muitos terminais têm operado só com cargas de terceiros, gerando competição com os portos públicos. A ideia é coibir a prática com regras mais duras.
No Brasil, a movimentação de carga - 700 milhões de toneladas ao ano, segundo o site da Secretaria de Portos - costuma crescer três vezes mais que a expansão do PIB (Produto Interno Bruto).
Isso faz com que os gargalos em infraestrutura portuária no país se tornem ainda mais críticos.
ANÁLISE
Concessão não resolve todos os problemas que travam o setor
Por DIMMI AMORA, na Folha de São Paulo, 25/06/2011.
Tornar os portos brasileiros eficientes depende de um conjunto de medidas mais amplo que a concessão de novos terminais. E a maioria dessas medidas está nas mãos do governo.
A Lei de Portos, aprovada em 1993 e que permitiu a concessão de áreas nos portos públicos para administração privada, foi a possível para uma época de elevado viés político-partidário.
Com um sindicato fortíssimo à época, os trabalhadores portuários conseguiram manter privilégios que já eram então incompatíveis com a atividade.
A contratação de mão de obra, mesmo nos terminais privados, depende da aprovação de um órgão externo que define quantidades, por exemplo.
Qual o sentido de investir em automação, uma tendência nos grandes portos do mundo para aumentar a eficiência, se ter homens é obrigatório?
Outra ineficiência está na infraestrutura de acesso, delegada aos órgãos governamentais de transporte, que investem pouco no setor.
Dificilmente esse investimento poderá ser incluído para ser feito por quem administrar o porto. E o governo terá que encontrar uma fórmula para evitar a atual lentidão em fazer essas obras.
Os portos também sofrem na mão de seus atuais gestores, as companhias docas. A direção delas é pouco profissional, sendo escolhida por decisão partidária.
Além disso, as companhias têm dívidas de anos de má gestão, o que dificulta o planejamento de novos investimentos devido à penhora de receitas, por exemplo.
Os diversos órgãos públicos que atuam nos portos, da Vigilância Sanitária à Polícia Federal, trabalham descoordenadamente e sem condições adequadas.
E isso tende a piorar se não houver um processo de integração, semelhante ao que se está iniciando nos aeroportos, e investimentos em equipamentos e servidores.
Um dos avanços da Lei de Portos foi a criação do Conselho da Autoridade Portuária, órgão que reuniria os vários atores do setor para auxiliar na gestão.
Mas esses conselhos acabam não tendo voz e, em muitos casos, nem chegam a se reunir. Se o governo quer voltar a participar da gestão, tem um caminho já aberto.
Tornar os portos eficientes é uma necessidade para um país que tem as commodities como importante fonte de recursos.
Os problemas elevam os custos dos produtos, tirando-lhes competitividade. O esforço do governo terá que ir além do "agora é com vocês" do sistema de concessões.
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